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quando queria pitar, arrancava uma folha, que torcia á modo de pavio e accendia na vela. Apenas escaparam ao incendiario alguns capitulos em dois canhenhos, cuja lettra miuda á custo se distingue no borrão de que a tinta, oxydando-se com o tempo, saturou o papel.

Tinha esse romance por titulo — Os Contrabandistas. Sua feitura havia de ser consoante á inexperiencia de um moço de 18 annos, que nem possuia o genio precoce de Victor Hugo, nem tinha outra educação litteraria, senão essa superficial e imperfeita, bebida em leituras á esmo. Minha ignorancia dos estudos classicos era tal, que eu só conhecia Virgilio e Horacio, como pontos difficeis do exame de latim, e de Homero apenas sabia o nome e a reputação.

Mas o traço dos Contrabandistas, como o gizei aos 18 annos, ainda hoje o tenho por um dos melhores e mais felizes de quantos me sugeriu a imaginação. Houvesse edictor para as obras de longo folego, que já essa andaria á correr mundo, de preferencia á muitas outras que dei á estampa nestes ultimos annos.

A variedade dos generos que abrangia este romance, desde o idylio até a epopéa, era o que sobretudo me prendia e agradava. Trabalhava, não pela ordem dos capitulos, mas destacadamente