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XIII

na tradição popular todas as fórmas para exprimir a sua concepção da natureza e da humanidade. O Prometheo era um conto das velhas gregas antes de ser a sombria tragedia cujo sentido é tão vasto que pagãos, christãos, philosophos de differentes escholas acham n'ella com que lisonjear as suas crenças e doutrinas[1]. A Cymbeline, The Merchant of Venice assentam sobre contos populares, como outras peças do tragico inglez. tecido d'um grande numero de contos de Boccacio e dos outros novellistas italianos, assim como da maior parte dos antigos novellistas de todas as nações saiu da tradição popular.

O estudo das origens litterarias está pois indissoluvelmente ligado ao dos contos populares.

Os hagiographos ou o povo, no seu desejo de adornar com bellos feitos a vida dos seus santos, não hesitaram muitas vezes em attribuir-lhes o que nas patranhas e historias da carochinha se conta de heroes imaginarios. Foi assim que o bispo do Porto D. Fernando Correa de Lacerda introduziu na lenda da Rainha Santa Izabel por elle escripta no seculo XVII, a historia do pagem que por obra d'um intrigante devia ir morrer queimado n'um forno, escapando por um milagre e sendo castigado com aquella morte o intrigante.

É a lenda ou conto de Fridolin, popular na Alsacia, de que Schiller fez a ballada Gang nach dem Eisenkammer, e de que a litteratura medieval offerece um grande numero de variantes[2].

Affonso o Sabio de Castella, o avô de D. Diniz, fizera d'ella uma das suas cantigas em louvor da Virgem, a cuja intervenção milagrosa attribuiu a salvação do innoconte; essa composição foi publicada por Adolf Helferich no Jahrhuch f. rom. u. englische Literatur, II,

  1. Vid. Patin, Etudes sur les tragiques grecs I, 3 254 not.
  2. Vid. Loiseleur Deslongschamps, Essai sur les fables indiennes, Paris, 1838. 8.º p. 132 ss; Hermann OEsterley, Gesta Romanorum. Berlin, 1872. 8.º N.º 283 e nota respectiva. A. d'Ancona, Romania, III, 187, s.