Página:Contos Tradicionaes do Povo Portuguez.pdf/108

Wikisource, a biblioteca livre

Foram para casa, e deu de comer sopinhas de leite e cousas boas á que era feia, pensando que era era sua filha, e a outra mandou-a deitar para a palha de uma loja cheia de têas de aranha, e sem ceia. Duraram as cousas assim muito tempo, até que um dia passou um principe e viu a menina da cara bonita á janella, muito triste e ficou logo a gostar muito d’ella, e disse-lhe que queria vir fallar com ella de noite ao quintal. A mulher ruim ouviu tudo, e disse á que estava agora feia e que cuidava que era a sua filha, que se preparasse e que fosse fallar á noite com o principe, mas que não descobrisse a cara. Ella foi, e a primeira cousa que disse ao principe foi — que estava enganado, que ella era muito feia. O principe dizia-lhe que não, e a pequena descobriu então a cara, mas a fada deu-lhe n’aquelle mesmo instante a sua formosura. O principe ficou mais apaixonado e disse que queria casar com ella; a pequena foi-o dizer á que pensava que ella era sua filha. Fez-se o arranjo da boda, e chegou o dia em que vieram buscal-a para se ir casar; ella foi com a cara coberta com um véo, e a irmã, que estava agora bonita, ficou fechada na loja ás escuras. Assim que a menina deu a mão ao principe e ficaram casados, a fada deu-lhe a sua formosura, e foi então que a madrasta conheceu que aquella era a sua enteada e não a sua filha. Corre á pressa a casa, vae á loja da palha vêr a pequena que lá fechára, e dá com a sua propria filha, que desde a hora do casamento da irmã tornára a ficar com a cara feia. Ficaram ambas desesperadas e não sei como não arrebentaram de inveja. É bem certo o ditado: «Madrasta nem de pasta.»

(Porto.)



21. O OVO E O BRILHANTE

Havia uma mulher, que tinha uma filha e uma enteada; estavam sósinhas em casa, uma sempre na casinha,