meiro somno, a rapariga desamarrou-se, foi buscar a cabra muito devagarinho, pôl-a em seu logar, e foi-se embora. Quando rei acordou, lembrou-se da pretinha, que era de encantar, puchou-a pela fita para a sua cama, mas a cabra começou a berrar, e o rei espantado a gritar que tinha o diabo em casa; acudiu muita gente e todos viram a cabra em vez da preta no quarto do rei. No outro dia á tarde, o rei foi vêr a filha do mercador, que andava a regar, e perguntou-lhe:
Oh menina, visto ser
De tanta discrição,
Hade-me saber dizer
Quantas folhas tem o seu manjaricão?
E ella, em despique:
Vossa magestade, que sabe
Lêr! escrever e contar,
Hade saber quantos bagos
De areia tem o mar?
Diz o rei:
E o beijinho por cima do véo?…
E ella:
E a cabra que fez méo, méo?…
O rei conheceu que ella o tinha disfructado, mas achou-lhe graça. A rapariga não quiz ficar por aqui. Soube que o rei ia para uma caçada, vestiu-se de homem, montou n’uma mula, e levou comsigo uma mascara, e foi seguindo a comitiva de longe. Depois de muito andar, o rei disse para parar um pouco, e que o deixassem sósinho. Assim que os cavalleiros se afastaram para longe, a rapariga tira a mascara da algibeira, saca de um punhal e vae para o rei, como quem quer matal-o, e grita-lhe: