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perdidos, para outra cama. O pequeno mais esperto não pregava olho, e lá pela noite adiante, viu entrar o homem ruim, de dentes arreganhados:

— Cheira-me aqui a gente nova!

A mulher confessou-lhe tudo; ora o pequeno tinha ido tirar as carapucinhas aos outros e tinha-as mettido nas cabeças dos irmãos e da sua. O homem máo passou pela cama das crianças, e pensando que eram os seus filhos foi ter á outra cama, e como os não viu com as carapucinhas, degolou-os logo a todos, e começou a comer n’elles. Os pequenos pelo aviso do irmão escapuliram-se, e quando já iam muito longe é que o homem ruim deu pelo engano; calçou umas botas de sete leguas, e tal passada deu que os pequenos lhe ficaram atraz; andou, andou e de cançado voltou e adormeceu no caminho. O pequeno roubou-lhe as botas de sete leguas, e assim pôz-se a salvamento mais os irmãos, e como o rei tinha guerras muito longe, elle levava as ordens, e trazia as noticias, e assim ganhou muito dinheiro com que tirou toda a sua familia da pobreza.

(Airão.)



52. O AFILHADO DE SANTO ANTONIO

Um homem tinha muitos filhos, e já não tinha a quem convidar para compadre; nasceu-lhe mais um, e elle disse: — Seja teu padrinho Santo Antonio. O pequeno cresceu, e andava com os outros irmãos no monte, quando se perderam e foram dar a uma cabana, onde morava uma velha, que lhes fez muita festa:

— Entrae para aqui, meus meninos, que eu dou-vos biscoutos.

Os pequenos entraram; a velha assim que os apanhou de dentro metteu-os dentro de uma arca, para os engordar e comer depois. De vez em quando dizia: