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O diabo tornou a ficar a dormir; a velha surrateira arrancou-lhe o segundo annel. O diabo tornou a acordar desesperado:

— Tem paciencia, filho; tornei-me a deixar dormir e a sonhar com a filha d’aquelle rei que nenhum medico sabe curar.

— Tambem é verdade; a doença d’ella é o sapo-sapão que está mettido no enxergão.

Tornou o diabo a dormir. Para arrancar o annel do olho é que foram os trabalhos.

A velha tirou-o com um espeto, e o diabo com a dôr e zangado com as pendedellas, sahiu pela porta fóra. O rapaz recebeu tudo da velha; voltou para o mundo, quando ella chamou o passaro: «Menino, menino, menino.» Foi d’ali entregar as contas ao ermitão. Depois passou pela terra do rei que tinha perdido o annel, que lhe deu muito dinheiro quando o tornou a achar debaixo da lage. Depois passou pela côrte do rei qµe tinha a filha doente, disse onde estava o sapo-sapão. A princeza melhorou logo, e o rei pediu-lhe para que dissesse a paga que queria.

— Quero que vossa magestade me dê o seu poder por oito dias.

O rei mandou deitar um pregão para elle governar oito dias; o rapaz partiu logo para a terra do sogro, e deu ordem logo que lá chegou para o mercador dentro em meia hora lhe vir fallar á sua presença. O mercador foi, mas quando chegou era já mais de uma hora. O rapaz disse:

— Podia-o mandar matar, por me ter desobedecido, em vir depois da meia hora.

— Oh senhor, não me demorei por minha vontade.

— Pois sim. Mas porque não soube em tempo desculpar aquelle pobre sargento que pôz fóra de sua casa?

O mercador conheceu então o antigo noivo de sua filha, que tinha sempre chorado, confessou o seu erro, e