— Descance, meu pae, que eu heide fazer com que elle hade mentir por força ao rei.
O pae deu licença. Ella vestiu-se de velludo cramezim, mangas e saia curta, toda decotada, e cabellos pelos hombros e foi passeiar para a tapada; até que se encontrou com o rapaz que guardava o boi Cardil. O rapaz era rapaz, e ella começou logo:
— Ha muito tempo que trago uma grande paixão, e nunca te pude dizer nada.
O rapaz ficou atrapalhado, e não queria acreditar n’aquillo, mas ella taes cousas disse, e taes geitinhos deu, que elle ficou pelo beiço. Quando o rapaz já estava rendido, ella exigiu-lhe que em paga do seu amor matasse o boi Cardil. Elle assim fez e deu-se por bem pago todo o santissimo dia.
A filha do fidalgo foi-se embora, e contou ao pae como o rapaz tinha matado o boi Cardil; o fidalgo foi contal-o ao rei, fiado em que o rapaz havia de explicar a morte do boi com alguma mentira. O rei ficou furioso quando soube que o criado lhe tinha matado o boi Cardil, em quem punha tanta estimação. Mandou chamar o criado.
Veiu o criado, e o rei fingiu que nada sabia; perguntou-lhe:
— Então como vae o boi?
O criado julgou vêr ali o fim da sua vida, e disse:
Perúa alva.
Corpo gentil,
Me fez a mim matar
O nosso boi Cardil.
O rei mandou que se explicasse melhor; o moço contou tudo. O rei ficou satisfeito por ganhar a aposta, e disse para o fidalgo:
— Não te mando cortar a cabeça, como tinhas apos-