Nos seus contos refere-se: «Ao glorioso S. Pedro, cujo freguez sou»; d'onde se deduz que vivia na freguezia de Alfama. A data em que começou a escrever os seus Contos fixamol-a em 1544, segundo esta referencia a uma armadilha de jogo: «e elle levava comsigo duzentos e vinte reales de prata, que era isto o anno de 1544, que havia quasi tudo reales.»[1] No conto XIII, da primeira parte, que versa sobre o anexim do real bem ganhado, allude outra vez a esta moeda: «o qual com muito contentamento por vêr que soube escolher, lhe deu um real em dois meios, como ora costumam.»[2] E tambem: «metteu real e meio na mão.»[3] Estas referencias fixam irrevogavelmente a epoca em que Trancoso escrevia.
Uma das circumstancias que levaram Trancoso a proseguir na continuação dos seus Contos, foi o terror que espalhou a chamada Peste grande de Lisboa, em 1569, circumstancia que lembra a peste de Florença que determinou Boccacio á composição do Decameron. No conto IX da segunda parte, declara Trancoso este motivo: «Assi o exemplo d'este marquez, os que este anno de mil e quinhentos e sessenta e nove, a esta parte perdemos mulheres, filhos e fazenda, nos esforçaremos e não nos entristeçamos tanto, que caiamos em caso de desesperação sem comer e sem paciencia, dando oceasião a nossa morte.»[4] D'esta peste, que ainda hoje se conhece entre o povo como uma data historica, a Peste grande, subsiste uma reminiscencia na chamada Procissão da Saude, que se faz em Lisboa. Inspirado pelo fervor religioso, que succedeu ao fim da peste, Trancoso publicou logo em 1570 um opusculo das Festas mudaveis, dedicado ao Arcebispo de Lisboa. A redaccão dos Contos ficou sus-