E destes taaes (sc. um philosopho) diz hum exemplo e põoe semelhãça de huma arvor que estava rreygada em huma pouca terra em meo de huma grande augua, e era bem basta de rrama e bem carregada de pomas. E em cima della estava um homem deleitandose muito em tomar ora de humas ora doutras. E em no pee darvor rroyam dous vermens, hum branco e outro preto e tiinhãlhe rroyda a rraiz pera cando daryã com ella em terra. E a huma parte estava hum lyom bravo cõ a gargãta aberta, tendo mentes quando el cayria, pera o arrebatar e comello. E a outra parte estava hum alicornyo muy espantoso, aguardando quando cayria a arvore, pollo debrotir e lastimar. E o mizquinho do homem tãto se deleitava em as pomas que nom parava mentes que nemhumas destas cousas nem curava dello.
Esta arvor senifica este mundo em que se o homem deleyta, tanto que lhe esqueece o feito de sua alma e nõ se nembra da hora da morte. E a terra sinifica a vida do homem que he breve e pouca, e que nom avera em que se asconda. A agua sinifica o medo e o grande espanto que o homem averá em a hora da morte. E os vermens, hum branco e outro preto, sinifica o dia e a noite que rroe em na vida do homem e lhe tolhem cada dia huma jornada. E o leom senifica o inferno, e o olicornio sinifica o purgatorio que está prestes com fogo e cõ fryo e com graves tormẽtos pera os homẽs pera sempre.
(Ms. de Alcobaça, n.º 266, fl. 145, v. (Na Bib. publica.) Mr. J. Cornu fez d'elle varios extractos na Romania, XI, publicando-os depois sob o titulo Anciens textes portugais.)