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Página:Contos Tradicionaes do Povo Portuguez.pdf/378

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cousas que agora vos quero perguntar, e acertando em todas terei para mim que acertaes no que fazeis, e senão, sois condemnado á morte.

Muito lhe pesou ao Commendador em ouvir isto, e quizera saber as culpas que lhe punham e desculpar-se d'ellas; porém el Rey o não quiz escutar, mas disse-lhe:

— Pela menhã mui cedo vinde-me aqui dizer: Em que logar do mundo é o meio d'elle? e Quanto ha de altura da terra ao ceu? e Que está imaginando o meu coração n'aquelle momento que vós me responderdes? E sem estas repostas e certas, não pareçais ante mim, nem me faleis.

E sem o querer ouvir se recolheu a uma camara a cear e dormir, e o Commendador ficou agastado imaginando no caso sem saber porque estava el Rey menencorio d'elle, nem entendia o que havia de responder a suas perguntas, e quando lhe representava a imaginação que se fosse, em tal caso tinha mór pena. E com isto se saiu a passear pola porta d'aquella sua casa, em a qual estava por hortelão um virtuoso homem, que na edade, filosomia do rosto e fala parecia muito ao Commendador, e differençava no trage sómente, que algumas vezes querendo por passatempo fazer festa, se vistia o hortelão roupas do Senhor, levemente se enganavam os creados da casa. E andando assi passeando foi vista sua tristeza pelo hortelão, que era virtuoso e de boa criação, e foi-se ao senhor, ao qual affincadamente pediu por mercê que lhe desse conta de sua paixão, que poderia ser que por seu meio lhe daria algum remedio. O senhor que sabia, que este hortelão era homem de muita habilidade e saber, lhe contou o caso todo como passava com el Rey. O hortelão que era muito sisudo:

— Senhor, tudo se remediará com uma cousa; o que he necessario fazer para remedio da affronta em que estamos, é que dispaes essas roupas e vistaes estas minhas, e eu fingirei ser vós e irei ter com el Rey, que já