ninguem queria morar porque lá dentro ouviam-se de noite grandes gritos e terrores; as raparigas, para pouparem o aluguel, foram pedir para as deixarem morar n’aquella casa. A mais nova, como mais animosa, foi morar para o ultimo andar.
Uma noite, mal ella se tinha acabado de deitar, ouviu uma voz gritar:
— Eu caio!
— Pois cae! – respondeu-lhe a rapariga. De um buraco do tecto caiu uma perna. Depois soou de novo o mesmo grito:
— Eu caio!
— Pois cae! – repetiu a rapariga; e assim foram caindo os braços, o tronco, até que ella achou diante de si um homem já muito velho e calvo. O velho chegou-se proximo da rapariga, e perguntou-lhe:
— Não tens medo de mim?
— Não.
— Fazes muito bem; és a primeira e unica pessoa que resiste ao medo de me vêr. Em paga da tua coragem toma lá esta bolsa, e quando te vires n’alguma afflicção diz sempre: Valha-me aqui o velho Querecas.
O dinheiro da bolsa nunca se acabava, e as tres irmãs começaram a viver com largueza. No entretanto a mais nova começou a sentir que por mais que se fechasse no seu quarto parecia-lhe que sentia metter-se alguem na cama com ella. Lembrou-se se seria o velho Querecas, e teve uma certa repugnancia; mas para certificar-se, uma noite accendeu de repente a luz, e viu deitado ao pé d’ella um mancebo formoso, que estava adormecido. Estava tão embebida a olhar para elle, que lhe caiu um pingo de cera na cara. O mancebo acordou de repente, e disse:
— Ah! Desgraçada, o que fizeste; dobraste-me o encantamento, que estava quasi no fim! Agora não me tornas mais a ver.