Página:Contos Tradicionaes do Povo Portuguez.pdf/68

Wikisource, a biblioteca livre

bordão, e então derramou-se pelo chão toda aquella porcaria que o povo lhe obrigou a lamber, sendo d’ali levado para a cadeia, e a menina para casa de sua mãe.

(Algarve.)



4. A SAIA DE ESQUILHAS

Um homem rico tinha tres filhas, e costumava ir passar o verão com ellas para o campo; ao voltar para a côrte ficou a filha mais velha, que era muito esperta, encarregada de arranjar a bagagem. Depois de ter tudo arrumado e prompto para partir, foi ter com a caseira da quinta, que andava no arranjo da sua casa. Em cima de uma caixa estava uma roca com estopa, e a menina pegou n’ella para se entreter:

— Menina, não pegue n’essa roca; póde metter alguma púa pelas unhas, e olhe que faz grandes dôres.

A velha continuou a governar a sua casa, quando sentiu um grito; veiu vêr o que era. Era a menina que tinha cahido desmaiada, sem sentidos. Deu-lhe a cheirar alecrim, alfazema, mas ella não voltava a si. Apoquentada com aquella desgraça, escondeu a menina, e logo que anoiteceu foi deital-a na tapada real; pôz-lhe uma almofada para recostar a cabeça e cobriu-a com uma manta, fingindo que estava ali a dormir. Passado outro dia foi lá vêr se a menina teria dado accordo de si. Nada. Calou-se muito calada e voltou para sua casa.

O principe costumava sempre andar á caça, e n’um dia recolheu-se áquella tapada, porque lhe anoiteceu depressa; mas foi grande o seu espanto quando descobriu ali uma menina muito formosa, a dormir, sosinha. Esteve primeiro a olhar para ella muito tempo; já se sentia apaixonado, e quiz acordal-a; ella estava córada e risonha, mas não se movia. O principe quiz acordal-a, porque bem conhecia que não estava morta, queria-lhe fallar. Foi tudo