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CONTOS E PHANTASIAS

d’uma especie de pequeno sanctuario onde poucas vezes penetravam as travêssas creanças de quem ella era como que segunda mãe.

Quando eu acertava de lá entrar com ellas, emquanto a pequenada corria de um lado para outro, vendo, tocando tudo, perguntando informações de todas as cousas, eu observava callada com o meu olhar de mais velha, mais penetrante e mais curioso.

Tudo alli era limpo, aceiado mas tudo antigo, datando sem duvida da sua adolescencia, do tempo em que ella fôra feliz, porventura requestada e formosa.

A alcova branca, discreta, com o seu oratorio de pau santo, cheio de bellas imagens, a Virgem risonha e loura com o menino nos braços, o Christo macerado e sangrento com a expressão de sobre-humana agonia no amortecido olhar.

No gabinete contiguo as cortinas, os reposteiros de chita, as poltronas, as pequeninas mezas cobertas com os seus panos de crochet, as estantes de livros, tudo emfim era bem conservado, sem ser novo; via-se que tinha sido o objecto de attentos cuidados, que todas aquellas cousas mudas haviam sido as companheiras unicas de uma existencia concentrada e solitaria.

Nas paredes, sobre as pequenas étagères, muitos