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CONTOS E PHANTASIAS
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— Sempre me decido, Francisca.

— Pois vae, Antonio, vae que não deshonra pedir trabalho e protecção...

— Receber-me-ha elle bem?

— Quem te não ha de receber bem, tôlo? vae que eu fico a pedir a Deus por ti!

Antonio de Vasconcellos foi e fallou com o velho amigo de seu pae, Jorge Alvim. Contou-lhe toda a sua vida trabalhosa, as luctas obscuras, as miserias que affrontára, descreveu-lhe a núa e triste agua-furtada em que viviam, elle e a irmã, as longas e plumbeas noites mal dormidas, a costura mal remunerada, a dureza dos senhorios.

E no gabinete cheio de conforto e de luxo aquellas palavras tristes, desesperadas e expirantes soavam lugubremente como um grito de agonia nas alegrias de um noivado...

— V. ex.a não sabia de uma cousa que lhe vou agora dizer. Seu pae salvou-me da morte uma vez no cerco do Porto, eu salval-o-hei custe o que custar das... garras da...

— Miseria, disse o moço com o rosto ligeiramente carminado.