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MARQUES DE CARVALHO

n’uma grande voltaire, poz-se a ler. Ficou a Candida defronte d’elle, a miral-o.

Vinha do jardim uma brisa cheia de perfumes, sacudindo as luzes dos dois bicos de gaz encerrados em globos de crystal finamente lavrado. Com os cotovellos sobre a mesa, o rosto de mento saliente e narinas afflantes descançando nas palmas das mãos, Candida continuava a olhar para o marido com uma expressão extranha, suave, repassada de ternuras dulcíssimas.

Parecia lançada á contemplação da propria felicidade. Era justamente aquillo que, annos antes, phantasiára a sua sonhadora imaginação de burguezinha estragada pelos mimos de seus paes extremosos e pacóvios: viver honesta ao pé de um marido bonito e de bom coração; estar sempre junto d’elle, para o consolar em todos os desgostos, rir com elle nas horas de alegria, ser-lhe sempre de uma fidelidade irreprehensivel e, sobretudo, contemplal-o a todo instante, silenciosa, longamente, envolvel-o nas sentimentaes suavidades do seu enlanguescido olhar de creoula amoravel! Nunca sentira-se tão feliz como depois de seu casamento com o Roberto, havia quasi dez mezes. Nem uma só contrariedade tivera após aquella noite commovente, em que recebeu o primeiro beijo do noivo no silencio de uma discreta alcôva toda cheia de flôres, rendas, fitas e perfumes! E com