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CONTOS PARAENSES
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quer alegres, um grato consolo para a alma.

Foi por isso que João, logo ao principio, deixou fugir um suspiro e, em seguida, a pouco e pouco, embrenhou-se na vasta floresta silenciosa e redolente dos seus antigos episodios de amores, quando, ainda no seu querido Pará, podia ver e ouvir quotidianamente a encantadora donzella que deve um dia ser sua esposa.[1] Foi tambem porisso que o moço estudante de direito recordou-se, — e com quantas saudades! — da magistral execução que a sua noiva sabia dar ao primor do illustre maestro allemão, — uma execução toda sentida, interpretando os minimos segredos, com dulcíssimos murmurios voluptuosos, que lhe davam melancholia ao espirito e suaves langores ao corpo.

Entrou João a imaginar que estava no Pará, ao lado de sua querida companheira, junto ao piano d’ella, no perfumado socego da sala deserta, extasiado na audição d’aquella phantasia esplendida! E logo, por uma transformação imaginativa, o piano

  1. Este conto foi escripto em 1886. A donzella de que se trata está hoje casada com o heroe da presente narração e póde gabar-se de ser a mais piedosa, a mais amoravel, a mais querida e a mais leal das esposas... com a vantagem de ser a mais dedicada e meiga de todas as mães.