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MARQUES DE CARVALHO

O céo, no entanto, enchera-se d’uma luz suave e esbranquiçada. Grandes nuvens escuras retalhavam-se no azul-ferrete do firmamento, para as bandas da cidade. Um vento frio e murmuroso como um soluço d’almas penadas fazia farfalhar a matta proxima, causando arrepios de mal-estar ás supersticiosas moças que estavam no cemiterio.... Agora calára-se a orchestra.

Subira um prégador para um pulpito armado ao ar livre, sob uma arvore de grande côma sombria, e recitava em voz cavernosa e com largos gestos tragicos, uma homilia contristadora sobre a transitoria felicidade mundana e a perenne bemaventurança celestial.

As mulheres, — mães, filhas, esposas, — que o ouviam, ficavam caladas, muito sérias, com os olhos grandemente abertos fixos em seu rosto bronzeado; no intimo, porém, no fundo da consciencia, levantavam um brado de maldição áquella felicidade que lhes roubára a companhia dos entes queridos e amoraveis.

Um homem de cabeça encanecida, que vagueava levando pela mão uma creança de tenra edade, — um lindo e pallido orphãosinho, — voltou-lhe costas nervosamente, soluçando, e fugiu para junto de um pobre tumulo tranquillo, em cuja grade se lia este lancinante poema de uma só phrase: — Á minha esposa....

No céo, as nuvens afastavam-se, evolavam-se