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CONTOS PARAENSES
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pela brisa, o rio abraçava numerosas ilhotas rasas, cobertas d’uma vegetação opulenta, que esbatia-se n’uns tons escuros, quasi indecisos, no limite do horisonte. Um socego de tabernaculo reinava por toda a parte, sob o azul ferrete do céo, onde as estrellas começavam a scintillar como as pedras preciosas d’um manto de rainha antiga. Nem uma nuvem occupava n’esse instante um espaço do firmamento. Ao longe, á direita da terra firme, tremulava uma pequena luz. A agua do rio, no fim da vasante, esgueirava-se pelo costado da canôa n’um murmurio dolente. A súbitas, na solemnidade do silencio, resoou um grito d’ave nocturna.

— Accende a lanterna, José, — disse Antonio ao caboclo, que obedeceu logo, voltando depois á sua posição habitual na prôa, fumando.

Antonio e Luiza tinham-se assentado sobre a mala que havia no centro da embarcação, entre dois paneiros de farinha sobrepostos, e uns grandes jarros com roseiras florídas.

Como tivesse refrescado o vento, Luiza sentiu frio, estremeceu. O marido foi á pôpa buscar um chale, cobriu-lhe com elle os hombros, conchegando-lh’o muito ao pescoço, amoravelmente.

Depois sentou-se ao lado d’ella. Era profunda a escuridão. Do logar em que achavam-se, apenas viam na prôa um ponto vermelho