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Resta então ao prefacista tentar. Com o intuito de ressaltar a importância do tema nos dias tecnologicamente sofisticados de hoje, e, ao mesmo tempo, sublinhar a preocupação do autor em nos aletrar sobre esses efeitos nefastos, encerro a apresentação desta coletânea com uma tentativa:

Quem aceita a premissa “não tenho nada a esconder,...”, aceita implicitamente também o direito do Estado e seus agentes de interceptar, registrar e interferir nas ações e comunicações de usuários de TIC – em suma, de monitorar essas ações (pois a premissa já responde negativamente à pergunta do meme “...qual é o problema?”) –, obtido tão somente do controle que exercem sobre o uso dessas tecnologias em sociedades que precisam cada vez mais delas.

Ocorre que tal presunção, de que há um direito implícito no controle tecnicamente exercível pelo Estado e seus agentes, sobre o uso das TIC, entre terceiros e jurisdicionados, pressupõe também que o Estado continuaria essencialmente o mesmo. Que o exercício desse direito pode ser coletivamente contido em limites benéficos, corretos ou socialmente vantajosos, já que em situações abusivas deve haver na estrutura do Estado “freios e contrapesos” acionáveis para coibi-las. Mas tal presunção atribui, por preguiça e comodidade, transitividade à ingenuidade, quando a história nos ensina bem o contrário: o poder sobrevivente nunca é ingênuo. Um tal “direito” muda a essência do Estado.

Tal direito implícito constitui-se em convite ao empoderamento absolutista para os detentores da capacidade de monitorar: basta que ajam em conjunto, amplificando seu poder semiológico para isso, e cooptem também os meios institucionais que poderiam coibir seus abusos (os quais também dependem das TIC). Tal é a definição que Mussolini dá ao fascismo. Que com tal capacidade pode assim abusá-lo, impunemente, de todas as formas tecnologicamente imagináveis. Em alguma etapa desse empoderamento, a cooptação dos meios de coibição de abusos se estende sobre o quarto poder, da mídia corporativa (que também depende das TIC). E, pela lógica, no passo seguinte sobre a mídia alternativa, para controle da “liberdade de expressão” na