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não teria mais lugar para o segredo: o direito à reserva de informações pessoais e da própria vida pessoal teria que ser embarcado nas tecnologias de comunicação para poder existir.

Corte para 2021: todos (ou quase todos) estamos conectados, tendo todas as nossas ações e o nosso tempo em frente a uma tela monitorados e quantificados por algumas empresas que, com esses dados — “o petróleo do Século XXT”, numa expressão já tornada clichê —, ganham dinheiro e poder literalmente a partir da exposição de nossa privacidade. A ideia do big data - combinações infinitas de bancos de dados digitalizados diversos, estruturados para produzir novos significados — é uma extensão do homem mais potente e global do que McLuhan previu a partir das tecnologias de sua época, sobretudo as telecomunicações e a eletricidade.

Nesse cenário, como ainda pode ser possível falar de privacidade? Mais do que falar: como é possível cada um ainda proteger a sua privacidade? Kerckhove diz que não podemos mais nos proteger, o que seu antecessor talvez também diria. Ele não acredita em criptografia e defende, sim, uma “ética da transparência”. “No lugar de tentar proteger sua privacidade com criptografia e senhas, que acabam quebradas mais cedo ou mais tarde, as pessoas deveriam passar a exigir dos governos e das empresas a mesma transparência a que suas vidas estão expostas”.

Provavelmente, Kerckhove (muito menos McLuhan) não conheceu a fundo os cypherpunks, defensores da utilização da criptografia como meio para provocar mudanças sociais e políticas. Originários de uma vertente da cultura hacker mais afeita à ação política e libertária, em contraponto à outra mais ligada ao liberalismo empreendedor das startups do Vale do Silício, os cypherpunks surgem nos anos 1990 dizendo que a única maneira de manter a privacidade na era da informação é com uma criptografia forte. À pergunta sobre o fim da privacidade, eles replicam com um firme: não. E, para defendê-la, propõem o uso de tecnologias que respeitem o direito de cada um de proteger sua privacidade, tendo como elemento central a criptografia forte.


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