Página:Dentro da noite.djvu/203

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Que bom! E o cretino a pensar que a humilhava, que a incomodava! A rua do Ouvidor devia estar esplêndida. Se ao menos ela, Laurinda Belfort, não estivesse muito mal! Sempre que vinha àquela horrível casa vinha tão sem gosto... O seu vestido era de rendas brancas, sobre um fundo de liberty verde gaio. Abriu o estojo do coufé, tirou um espelho, um pompon de pó de arroz, viu-se, achou-se bela com o seu chapéu que era uma rosa debruada de uma enorme pluma verde pálido. E, de fronte do espelho, a idéia de fugir à humilhação apuou-lhe de novo o cérebro. Não havia dúvida. Nada de cenas que demonstrem amor. Apenas, ao encontrar o mariola -uma frase triste:

— Ah! meu amigo, foi-me impossível ir hoje!

Gozar a cara dele, negar a sua ida lá, e mesmo que ele dissesse não ter ido também mostrar um ar indiferente... Ah! Tortura-lo com uma indiferença calma, ignorante, com alguns bocejos, até tê-lo uma última vez e deixa-lo, abandona-lo, não ir mais -ela, ela, ela a vencedora! desprezar as suas unhas, o prazer mórbido de toca-las, as unhas... ah! canalha!

Então, sob essa impressão, Laurinda Belfort inclinou-se vivamente:

— José, para a cidade, depressa!

O carro tornou a rodar, enquanto, reclinada na almofada de seda, Laurinda torcendo os dedos, sentia, por mais que não quisesse sentir, a falta daquela hora infame, daquelas frases tolas, a falta daquelas unhas que lhe davam a renovação