Página:Dentro da noite.djvu/211

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Eu tenho medo, oh! muito medo... E aquele trecho da secretaria não é para acalmar o destrambelhamento dos meus nervos. Tudo é branco, limpo, asseado, com o ar indiferente nas paredes, nos móveis sem uma poeira. Os empregados, porém, movem-se com a precipitação triste a que a morte obriga os que ficam. Retintins de telefones repicam seguidamente nos quatro cantos. Os diálogos cruzam-se, diálogos em que as vozes falam para dores indizíveis.

- Mais um doente?

- Ah! sim, ciente.

- Qual? Não há mais lugar. O de nome José Bernardino? Vou ver.

E mais adiante:

- Olhe, 425? Morreu ontem à noite. Se já seguiu? Já.

Enquanto essas notícias são dadas às bocas dos fones, há mulheres pálidas e desgrenhadas que esperam novas dos seus doentes, há velhos, há homens de face desfeita, uma série de caras em que o mistério da morte, lá fora, entre as árvores, incute um apavorado respeito e uma sinistra revolta. Quantas mães sem filhos! Quantos pais à espera da certeza da morte dos filhos! Quantos filhos ali, apenas para tratar do enterro dos que lhe deram o ser. Ela não respeita idade, passa a foice purulenta em tudo, está lá reinando, fora, no jardim, entre as árvores, morro acima. Os funcionários têm uma delicadeza fria.

- Que deseja, minha senhora?