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CAPITULO V
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politica do seu paiz, a qual com Canning ou outro qualquer nunca perdia de vista o lado utilitario, sacrificando-se no altar do altruismo internacional. Na sua correspondencia tratava apenas A' Court de persuadir seu chefe, se mistér era, da facilidade com que as facções oppostas ateariam o fogo em Portugal, e mostrava-se convencido de uma cousa que só peccava pela verdade e em que concordavam quantos observavam os negocios de Portugal, a saber, que era impossivel ahi estabelecer um governo estavel mediante uma regencia sem que Dom Miguel n'ella occupasse o primeiro posto.

Dona Izabel Maria deixou de pensar em ser rainha (se é exacto que d'isso tivesse jamais cuidado a serio) para pensar em continuar a exercer a regencia. A' Court acabou por admittir e transmittir que a considerava pessoalmente incapaz de acariciar um designio incompativel com os direitos dos que possuiam titulos legaes para terem sobre ella a precedencia em materia de successão. Por sua vez o conselho serenou-se e houve desde então nova razão de esperar que nada pelo menos perturbaria seriamente a nação até ser conhecida a deliberação de Dom Pedro.

Que esta deliberação reabriria o campo das intrigas e forneceria a cada partido o ensejo de experimentar suas forças era fatal. No decorrer da audiencia concedida ao embaixador britannico[1], na qual Dona Carlota Joaquina fallou pouco e vagamente na successão da coroa, deixando arteiramente pairar duvidas sobre suas verdadeiras intenções, observou ella incidentemente que a ausencia de tumultos era quasi um milagre, mas que elles estalariam quando a decisão do Imperador-Rei fosse promulgada, pois «o paiz estava cheio de mações e de pessoas de maus bofes (evil minded), ainda que o povo tivesse boa disposição e o exercito tambem, excepção feita d'alguns officiaes, o que a tranquillizava quanto ao resultado (she was not all uneasy about the result)». Poderia ter ajuntado que ella se encarregaria d'isso.


  1. Despacho secreto e confidencial de 23 de Junho de 1826, B. R. O., F. O.