Página:Echos de Pariz (1905).pdf/250

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Na capella ardente, entre os generaes que o guardam, rezam padres, e freiras desfiam os seus grossos rosarios. Ao pé do caixão ha um hyssope, n’uma caldeira com que Pariz, ao desfilar, asperge as pregas da bandeira que cobre o corpo, de modo que ao fim do dia a tricolor está toda orvalhada de agua benta. É o cura da Magdalena, de cruz alçada, com o seu clero, que vem ao pateo do Elyseu fazer a entrega do corpo, segundo o velho ritual de Pariz. Agora aqui vão padres atraz do carro funerario. Toda esta pompa marcha para Notre-Dame. Ás portas da antiga çathedral, o arcebispo de Pariz reza os responsos finaes, e do pulpito, como nos tempos de Bossuet, faz a oração funebre do presidente da Republica. Os radicaes, livres-pensadores, entraram na sombria nave, e de joelhos, por decencia, abalados por vagas memorias, baixaram a cabeça ao levantar da hostia. E depois outros padres irão ao Pantheon, desconsagrado pela Republica, para rebenzer o jazigo do presidente, que é ao lado do jazigo de Voltaire!

Estranhas vicissitudes! Carnot morto, leva atraz de si pelas ruas de Pariz o radicalismo compungido — e é para os altares que o vae levando.

Conheço uma velha gravura allegorica do seculo XVI, em que, atraz d’um cortejo, e tambem funerario, se vê um personagem de cornos, de pés de bode, que, todo torcido, com o rabo vexadamente mettido entre as pernas pelludas, vem rosnando e roendo as unhas, n’uma evidente mostra de humilhação e rancor. É o