Página:Echos de Pariz (1905).pdf/60

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Não sei se fallei já do calor. Está asphyxiante. E o que o torna mais duro de atravessar é a grève dos cocheiros. Pariz está sem tipoias — o que é, sobretudo n’este momento, como o deserto sem camelos. Se n’esta super-civilisada cidade o serviço dos omnibus ou dos bonds fôsse facil, exacto e rapido, a falta de carruagens não causaria desgostos — e seria mesmo uma salutar instigação á economia. Mas o omnibus e o bond, em Pariz, são instituições rudimentares. É mais facil para um pariziense entrar no céu do que n’um omnibus. Para obter o logar na bemaventurança basta, segundo affirmam todos os santos padres, ter caridade e humildade. Para obter o logar do omnibus estas duas grandes virtudes são inuteis e, mesmo, contraproducentes. Antes o egoismo e a violencia. Depois de conquistar o logar, a outra difficuldade insuperavel é sahir d’elle — por aquelle meio natural e logico que consiste em chegar e apear. Nunca se chega — senão quando já é desnecessario. Eu e um amigo partimos um dia da gare d’Orleans, á mesma hora; eu no comboio para Portugal, elle no omnibus para o Arc de L’Étoile. Quando eu cheguei a Madrid soube, por um telegramma, que o meu amigo ia ainda na Praça da Concordia. Mas ia bem. O omnibus em Pariz é o grande refugio e o local do namoro. Quanto mais comprida a jornada, mais demorado portanto o encanto. O meu amigo encontrára no seu omnibus a creatura dos seus sonhos. Era uma loura com sardas promettedoras. Quando, em-