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Monologo de uma Sombra


«Sou uma Sombra! Venho de outras éras,
Do cosmopolitismo das monéras.
Polypo de reconditas reintrancias,
Larva do cháos tel ùrico, procedo
Da escuridão do cósmico segredo,
Da substancia de todas as substancias!

A symbiose das coisas me equilibra.
Em minha ignóta mónada, ampla, vibra
A alma dos movimentos rotatórios.
E é de mim que decorrem, simultaneas,
A saúde das forças subterraneas
E a morbidez dos sêres illusórios!

Pairando acima dos mundanos tectos,
Não conheço o accidente da Senectus
— Esta universitaria sanguesuga
Que produz, sem dispendio algum de virus,
O amarellecimento do papyrus
E a miseria anatómica da ruga!