XIX
Conheci que Magdalena era boa em demasia, mas não conheci tudo duma vez. Ella se revelou pouco a pouco, e nunca se revelou inteiramente. A culpa foi minha, ou antes a culpa foi desta vida agreste, que me deu uma alma agreste.
E, falando assim, comprehendo que perco o tempo. Com effeito, se me escapa o retrato moral de minha mulher, para que serve esta narrativa? Para nada, mas sou forçado a escrever.
Quando os grillos cantam, sento-me aqui á mesa da sala de jantar, bebo café, accendo o cachimbo. Ás vezes as idéas não vêm, ou vêm muito numerosas — e a folha permanece meio escripta, como estava na vespera. Releio algumas linhas, que me desagradam. Não vale a pena tentar corrigil-as. Afasto o papel.
Emoções indefiniveis me agitam — inquietação terrivel, desejo doido de voltar, de tagarelar novamente com Magdalena, como faziamos todos os dias, a esta hora. Saudade? Não, não é isto: é desespero, raiva, um peso enorme no coração.