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Página:Graciliano Ramos - S. Bernardo (1934).pdf/117

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S. BERNARDO
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Procuro recordar o que diziamos. Impossivel. As minhas palavras eram apenas palavras, reproducção imperfeita de factos exteriores, e as della tinham alguma coisa que não consigo exprimir. Para sentil-as melhor, eu apagava as luzes, deixava que a sombra nos envolvesse até ficarmos dois vultos indistinctos na escuridão.

Lá fóra os sapos arengavam, o vento gemia, as arvores do pomar tornavam-se massas negras.

— Casimiro!

Casimiro Lopes estava no jardim, acocorado ao pé da janella, vigiando.

— Casimiro!

A figura de Casimiro Lopes apparece á janella, os sapos gritam, o vento sacode as arvores, apenas visiveis na treva. Maria das Dores entra e vai abrir o commutador. Detenho-a: não quero luz.

O tic-tac do relogio diminue, os grillos começam a cantar. E Magdalena surge no lado de lá da mesa. Digo baixinho:

— Magdalena!

A voz della me chega aos ouvidos. Não, não é aos ouvidos. Tambem já não a vejo com os olhos.

Estou encostado á mesa, as mãos cruzadas. Os objectos fundiram-se, e não enxergo sequer a toalha branca.

— Magdalena...

A voz de Magdalena continua a acariciar-me. Que diz ella? Naturalmente pede para mandar algum