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Página:Graciliano Ramos - S. Bernardo (1934).pdf/138

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GRACILIANO RAMOS

— Falta nada! Tem tudo, a sinhá manda tudo. Um despotismo de luxo: lençoes, sapatos, tanta roupa! Para que isso? Sapato no meu pé não vai. E não me cubro. Só preciso uma esteira.
Uma esteira e o fogo.
— Está direito, mãe Margarida. Passe bem.
E sahi, agastado com Magdalena. Avistei na outra banda Marciano, que tangia o gado.
— Espera lá.
Atravessei a pinguela e fui ver o ultimo producto Limosino-Caracu.
— Magreirão.
Não estava, mas achei que estava.
— Não me responda, entupa-se.
A culpada era Magdalena, que tinha offerecido á Rosa um vestido de seda. E’ verdade que o vestido tinha um rasgão. Mas era disparate.
— Deitasse fóra, foi o que eu disse a Magda­lena. Se estava estragado, era deitar fóra. Não é pelo prejuizo, é pelo desarranjo que traz a esse povinho um vestido de seda.
Magdalena respondeu-me com quatro pedras na mão, e ficámos de venta inchada uma sema­na. Eu por mim remoi um rancor excessivo.
O telhado da serraria era uma nodoa vermelha que as chuvas, aqui e ali, haviam tingido de preto. Na outra margem do riacho a cabeça cur­vada de Margarida mexia-se lentamente por cima das liastes do capim. E, subindo uma vereda, a figurinha de Marciano collava-se ás rezes.