161
S. BERNARDO
— Vá para o inferno, trate da sua vida.
Aquella resistência enfureceu-me:
— Deixa ver a carta, gallinha.
Magdalena desprendeu-se e entrou a correr
pelo quarto, gritando:
— Canalha!
D. Gloria chegou á porta, assustada:
— Pelo amor de Deus! Estão ouvindo lá
fóra.
Perdi a cabeça:
— Vá amolar a puta que a pariu. Está mouca, ahi com a sua carinha de santa? E’ isto: puta que a pariu. E se achar ruim, rua. A senhora e a boa de sua sobrinha, comprehende? Puta que pariu as duas.
D. Gloria fugiu com o lenço nos olhos.
— Miserável! bradou Magdalena.
E eu só sabia dizer:
— Mostra a carta, perua.
Magdalena rasgou o papel em pedacinhos e
atirou-os pela janella:
— Miserável!
Sahiu como um redemoinho. No corredor ainda gritou:
— Assassino!
Atordoado, murmurei:
— Cachorra!
E fiquei olhando os pedaços de papel que na
manhã de vento esvoaçavam pelo jardim, entre
Página:Graciliano Ramos - S. Bernardo (1934).pdf/163
Aparência