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Página:Graciliano Ramos - S. Bernardo (1934).pdf/184

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GRACILIANO RAMOS

mos a fumaça que se eleva de casas nossas, onde vive gente que nos teme, respeita e talvez até nos ame, porque depende de nós, uma grande sereni­dade nos envolve. Sentimo-nos bons, sentimo-nos fortes. E se ha ali perto inimigos morrendo, sejam embora inimigos de pouca monta que um moleque devasta a cacete, a convicção que temos da nossa fortaleza torna-se estável e augmenta. Diante disto, uma boneca traçando linhas invisiveis num papel apenas visivel merece pequena consideração. Desci, pois, as escadas em paz com Deus e com os homens, e esperava que aquelles pios infames me deixassem emfim tranquillo.
Matutando, penetrei no jardim e encaminhei-me ao pomar, fazendo tenção de ver se a poda es­tava em regra.
Defronte do escriptorio descobri no chão uma folha de prosa, com certeza trazida pelo vento. Apanhei-a e corri a vista, sem interesse, pela bo­nita letra redonda de Magdalena. Francamente, não entendi. Encontrei diversas palavras desco­nhecidas, outras conhecidas de vista, e a disposição dellas, terrivelmente atrapalhada, muito me difficultava a comprehensão. Talvez aquillo fosse bem feito, pois minha mulher sabia grammatica por baixo d’agua e era fecunda em riscos e entreli­nhas, mas estavam riscados periodos certos, e emvão tentei justificar as emendas.
— Occultar com artificios o que deve ser evi­dente!