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Página:Graciliano Ramos - S. Bernardo (1934).pdf/193

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S. BERNARDO

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Pouco a pouco me fui amadornando, até cahir num somno embrulhado e penoso. Creio que so­nhei com rios cheios e com atoleiros.
Quando dei accordo de mim, a vela estava apagada e o luar, que eu não tinha visto nascer, entrava pela janella. A porta continuava a ran­ger, o nordeste atirava para dentro da sacristia folhas seccas, que farfalhavam no chão de ladri­lhos brancos e pretos. O relogio tinha parado, mas julgo que dormi horas. Gallos cantaram, a lua dei­tou-se, o vento se cançou de gritar á toa e a luz da madrugada veio brincar com as imagens do oratotorio.
Ergui-me, o espinhaço doído da posição incom­moda. Estirei os braços. Moido, como se tivesse le­vado uma surra.
Sahi, dirigi-me ao curral, bebi um copo de lei­te. Conversei um instante com Marciano sobre as corujas. Em seguida fui passear no pateo, esperan­do que o dia clareasse de todo.
Realmente a mata, enfeitada de paus d’arco,estava uma belleza.
Tres annos de casado. Fazia exactamente um anno que tinha começado o diabo do ciume.
A serraria apitou; as suissas de seu Ribeiro surgiram a uma janella; Maria das Dores abriu as portas; Casimiro Lopes appareceu com uma braça­ da de hortaliças.
Desci ao açude. Derreado, as cadeiras doen-