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Página:Graciliano Ramos - S. Bernardo (1934).pdf/199

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S. BERNARDO

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Deixe de doidice. Quer dar o fora? Perfeitamente, não lhe seguro as pernas. Se quizesse ficar, po­dia viver ahi até criar canhão, que ninguém lhe pi­sava nos callos. Mas se não quer, acabou-se. Ago­ra o que não tem geito é escafeder-se como quem vai tangido. Isso não. Ao Deus dará, com uma no cano, outra no fecho, não. Prepare-se, arran­je os seus picuás.
— Estão arranjados.
— Então é viajar como gente, com decencia. E’ necessário que se saiba onde vai morar e quan­to precisa para se manter.
— Não preciso de nada. Onde vou morar não sei. O que sei é que tenho de sahir hoje.
— Não seja criança, disse eu arrastando as palavras. A senhora é capaz de pegar no pesado?
Não dá meia missa. Encruou nos romances, e até os assentamentos de baptizados lhe seriam difficeis.
Pouco a pouco d. Gloria abrandou. Ignoro se procedeu assim em conformidade com o habito de abrandar ou se tinha vindo resolvida a abrandar.
— Pense no aluguel das casas na cidade, pen­se no preço dos remedios. Adoecer é facil, d. Glo­ria, mas tirar a moléstia do corpo e um trabalhão. Pense no mercado, no cobrador da luz, na penna d’agua. Hoje em dia a vida é difficil em toda a parte, mas na cidade a vida é um buraco, d. Gloria.
D . Gloria confessou que a vida na cidade é de facto um buraco. Tinha mostrado o desprendi-