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Página:Graciliano Ramos - S. Bernardo (1934).pdf/214

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GRACILIANO RAMOS

rações. Que estupidez! Que porcaria! Não é bom vir o diabo e levar tudo?
Sol, chuva, noites de insomnia, cálculos, combi­nações, violências, perigos — e nem sequer me res­ta a illusão de ter realizado obra proveitosa. O jardim, a horta, o pomar — abandonados; os mar­recos de Pekin — mortos; o algodão, a mamona — seccando. E as cercas dos vizinhos, inimigos fe­rozes, avançam.
Está visto que, cessando esta crise, a proprie­dade se poderia reconstituir e voltar a ser o que era. A gente do eito se esfalfaria de sol a sol, ali­mentada com farinha de mandioca e barbatanas de bacalhau; caminhões rodariam novamente, con­duzindo mercadorias para a estrada de ferro; a fazenda se encheria outra vez de movimento e rumor.
Mas para que? Para que? não me dirão? Nesse movimento e nesse rumor haveria muito choro e haveria muita praga. As criancinhas, nos casebres hú­midos e frios, inchariam, roidas pela verminose. E Magdalena não estaria aqui para mandar-lhes remedio e leite. Os homens e as mulheres seriam animaes tristes.
Bichos. As criaturas que me serviram durante annos eram bichos. Havia bichos domésticos, como o Padilha, bichos do mato, como o Casimiro Lopes, e muitos bichos para o serviço do campo, bois man­sos. Os curraes que se escoram uns aos outros, lá em baixo, tinham lampadas eléctricas. E os bezer-