Página:Guerra dos Mascates (Volume I).djvu/125

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do palato e recobrou alguma flexibilidade. Teve dó dos olhos negros, lembrando-se da aflição que neles havia de produzir sua audácia.

Tossiu o nosso Lisardo; afinou de leve a garganta, e com o gesto mais arredondado, entrou a recitar para umas estrelas defronte:

DÉCIMA!

disse ele com voz de epígrafe e prosseguiu:

Entre um morrer e viver
Que me assalta a todo instante,
Traz-me sempre uma inconstante
Só constante em meu sofrer.
Quando me cuido morrer,
Dá-me Belisa uns carinhos;
Torno à vida aos bocadinhos,
Eis logo me deita uns olhos
Que o foram, mas já são molhos

De enfados por entre espinhos.

Apenas começou o recitativo, os olhos negros bruxulearam através da gelosia, e foram a pouco e pouco se enfiando tanto pelo gradil, que já se via junto deles uma testa branca de leite e um narizinho afilado do mais puro tipo pernambucano.

— Ai, ai!... murmuraram no fim os lábios que se adivinhavam em uma sombra rósea por entre o crepúsculo da rótula.

Compreendeu Lisardo