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que a molestava, deixou-se lentamente cair de joelhos, ficando entre os dela, a olhar para ela.

Camargo, entretanto, já não era daquele mundo. Passeava de um para outro lado, com as mãos para trás, a morder a ponta do bigode. De quando em quando parava e olhava para o grupo das duas senhoras, mas era só maquinalmente; o seu olhar baço indicava que ele ia mergulhado em profundas cogitações.

Naquele homem céptico, moderado e taciturno, havia uma paixão verdadeira, exclusiva e ardente: era a filha. Camargo adorava Eugênia: era a sua religião. Concentrara esforços e pensamentos em fazê-la feliz, e para o alcançar não duvidaria empregar, se necessário fosse, a violência, a perfídia e a dissimulação. Nem antes nem depois sentira igual sentimento; não amou a mulher; casou porque o matrimônio é uma condição de gravidade. O maior amigo que teve foi o conselheiro Vale; mas essa mesma amizade que o ligara ao pai de Estácio, nunca recebera a contraprova do sacrifício; aliás apareceria em toda a sinceridade a natureza do médico. Ele só conhecia os afetos, por assim dizer, caseiros e inertes, os que não sabem nem podem afrontar as intempéries da vida. Nas relações morais dos homens possuía somente o troco miúdo da polidez; a moeda de