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amor e nascida uma filha, não santificou o senhor a situação em que se achavam?

— A curiosidade é justa, replicou Salvador, mas a resposta é decisiva. Casar era a nossa justificação; era um argumento contra o ressentimento de meu pai. Nos primeiros dias da nossa fuga do Rio Grande, a própria embriaguez da felicidade desviou qualquer idéia de santificar e legalizar uma união consentida pela natureza. Depois vieram os trabalhos e as necessidades. Como eu tinha certeza de não fugir ao dever que tomara em meus ombros, ia adiando o ato de mês para mês, de ano para ano. Afinal o projeto esvaiu-se de todo. Estávamos ligados pela miséria e pelo coração, não pretendíamos o respeito da sociedade; triste desculpa; e ainda mais triste recordação, porque o casamento teria talvez obstado os acontecimentos posteriores. Helena contava seis anos. Minha fortuna, adversa sempre, com intermitências favoráveis, parecia abrandar um pouco. Ia encetar um novo meio de vida, quando uma circunstância grave me chamou ao Rio Grande. Meu pai adoecera; mandava-me o seu perdão, ordenando-me que o fosse ver sem demora. Obedeci prontamente. Do que ele me remeteu para as despesas de viagem e outras, deixei alguma coisa a Ângela e Helena, e parti.