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HISTORIA DA INQUISIÇÃO

tico testemunho tres annos antes, tinham agora mudado! Quando assim fosse, o modo dubidativo com que são accusados nas instrucções a D. Miguel da Silva está mostrando que elles respeitavam as exterioridades, e da sua vida privada não se podia inquirir, antes de 1534, sem quebra das mais solemnes promessas. Mas, que importava aos fautores da politica intolerante que o rei practicasse um acto deshonroso para lhes saciar a sede de vingança? Na verdade, depois das concessões feitas aos christãos-novos em 1507 e, sobretudo, da faculdade que se lhes dera de saírem do reino com familias e bens, quaesquer providencias para os obrigar a seguirem a religião dominante estavam longe de serem tão odiosas como o systema de compulsão adoptado a principio. A intolerancia para com elles podia ser, ao mesmo tempo, atraiçoada e impolitica, mas não era tão brutalmente atroz: agora, porém, pedindo-se a Inquisição, por maior que fosse a moderação com que D. Manuel esperava houvessem de proceder os inquisidores, as suas promessas, successivamente confirmadas e ampliadas, não deixavam por isso de ser desmentidas, com escandalosa quebra da fé publica, e tanto mais escandalosa quanto é certo que, não só das ins-