Página:Herculano, Alexandre, História da Origem e Estabelecimento da Inquisição em Portugal, Tomo I.pdf/303

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menos as boas palavras da dissimulação. Persuadidos de que nenhuma outra cousa havia a esperar, alguns mais previdentes tinham abandonado a patria[1]; mas o grande numero ainda confiava em que elrei não ousaria collocar-se abertamente á testa da perseguição, com quebra da fé publica. A lei de 14 de junho vinha dar-lhes cruel desengano. A Inquisição, com todas as atrocidades de que o resto da Peninsula era theatro, surgia ante seus olhos como um espectro. Para elles cifrava-se a perspectiva do futuro na morte e só na morte[2]. Os mais audazes, apesar do rigor das penas impostas contra os que buscassem esquivar-se á sorte que os esperava, tentaram a fuga, uns com feliz, outros com infeliz exito. Se acreditarmos as memorias escriptas pelos christãos-novos, as barbaridades usadas com os appreendidos na tentativa foram taes, que reputavam preferivel o viver na

  1. «qui (rex) bona verba, factis tamen... penitus contraria adhibendo, illos ad animorum inquietudinem... conduxit, adeo quod eorum aliqui futura praedicentes, regiamque, elsi latentem, indignationem, seu potiús animi corruptionem sentientes, a diclis regnis recesserunt»: Memoriale, l. cit., f. 21.
  2. «seipsos pro mortuis meritò reputarunt»: Ibid f. 27 v.