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de Jeronymo Ricenati em Portugal. Os empenhos e o dinheiro faziam tudo. Choviam os breves, os perdões, as dispensas. Os preços variavam; porque a somma era graduada, talvez, na razão inversa da influencia da pessoa que sollicitava o despacho. Capodiferro sabia ser serviçal quando eram poderosos os protectores; mas a veniaga espiritual devia subir de quilate quando a valia do sollicitador era pequena[1]. O nuncio não fazia, porém, senão exaggerar o espirito interesseiro da corte de Roma. Lá, tambem, a benevolencia

  1. «... da estada do nuncio aquy creceo tanto a ousadia nos máos e tanta segurança de poder errar sem castigo e tanta certeza de perdões dos erros por qualquer emformação que seja deles, per preços muy desonestos e inormes e outros muy baratos, e em todos com craro fim e respeito do interesse proprio sem lembrança nem da rezão da cousa, nem do escandalo dela, nem da diminuição da jurdição dos prelados a que totalmente são cerradas as portas per esta via de poder castigar nenhum máo, nem governar suas prelacias, tantas são as dispensações e os perdões e as bullas que por dinheiro e amizade se alcanção em casa do nuncio indistinctamente em todo caso, crime e pena, etc.» — Minuta da carta de D. João iii a D. Pedro de Mascarenhas de 4 de agosto de 1539, na Correspond. Orig. de D. Pedro Mascarenhas, na Bibliotheca da Ajuda.