Página:Herculano, Alexandre, História da Origem e Estabelecimento da Inquisição em Portugal, Tomo II.pdf/257

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haver Capodiferro procedido naquelle caso sem o prevenir e de ter inhibido officialmente o infante de usar do seu officio, negando a legitimidade de uma nomeiação feita por elle rei. Ordenava a D. Pedro que dissesse ao papa, como advertencia propria, que, se não retirasse o nuncio, este seria expulso, até para evitar alguma commoção popular; e rompendo, emfim, um silencio que D. João iii dizia ter guardado por excesso de delicadeza para com o pontifice, accusava o delegado apostolico de todo o genero de corrupções e de ser pelo seu procedimento immoral em Lisboa o opprobrio da corte de Roma[1].

Tal era o estado a que as cousas tinham chegado; taes as tristes consequencias dos erros commettidos por um principe ignorante e fanatico, dominado por frades e por hypocritas, e que tomara por principal mister de rei perseguir a porção mais rica e mais industriosa dos proprios subditos, embora tragando affrontas, arruinando o paiz, abrindo o campo a todo o genero de immoralidades, calumniando o christianismo e desobedecendo aos preceitos da tolerancia e da caridade

  1. Minuta de carta a D. Pedro Mascarenhas, sem data; Correspond. Orig., f. 67 v. e segg.