Página:Herculano, Alexandre, História da Origem e Estabelecimento da Inquisição em Portugal, Tomo III.pdf/172

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A gente hebréa ficou aterrada. O Porto tinha presenceiado mais de uma scena violenta, fructo do caracter irascivel do carmelita. O procurador dos feitos da coroa fora já mandado espancar por elle, em consequencia de ter offendido certos direitos episcopaes no exercicio do seu cargo, e um sobrinho do conde da Feira, que passara pelo prelado sem se descubrir, fora por elle insultado e advertido de que a repetição da descortezia talvez lhe custasse a vida. O ruído que fez o successo trouxe um inquerito judicial, que o carmelita só pôde impedir, supplicando a intervenção do proprio conde da Feira. Tal era o homem que os christãos-novos tinham tido a imprudencia de irritar.

O bispo do Porto sabía até onde chegavam seus direitos episcopaes; sabía que para ser inquisidor na propria diocese não precisava da auctoridade da Inquisição. Começou, portanto, a processar os christãos-novos. O concelho geral não tardou a estabelecer uma delegação sua no Porto, mas o prelado, no qual virtualmente a propria bulla de 23 de maio de 1536 reconhecia o direito de se ingerir naquellas materias, não se esquecia, ou residindo na diocese ou na corte, de aggravar a sorte da raça proscripta, cujas queixas eram