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mortos nem sequer occupavam um breve espaço de terra; porque as correntes do Tejo íam depositá-las no fundo solitario do mar.

Resta-nos uma carta de João de Mello escripta a elrei, sem data de anno, mas que coincide com esta epocha[1]. E’ a descripção de um auto-de-fé, redigida no mesmo dia, e poucas horas depois daquella festa de can-

  1. G. 2, M. 2, N.° 40, no Archivo Nacional. A carta é original e datada de Lisboa a 14 de outubro. Elrei, portanto, estava fóra da capital, provavelmente em Évora. De 15 de novembro de 1542 existe tambem uma carta original de D. João iii datada de Lisboa e dirigida ao infante D. Henrique, dando-lhe conta de um auto-de-fé que se acabava de celebrar. (Corpo Chronol. P. 1, M. 73, N.° 16 no Arch. Nac.) Na carta de João de Mello mencionase o supplicio da mulher e da filha de um mercador chamado mestre Thomaz, o que do Memorial dos christãos-novos, na Symmicta, se vê tinha sido anterior a 1544. Assim a carta de João de Mello é com probabilidade de 1542, sendo de crer que queixando-se elle do pejamento dos carceres em 14 de outubro, se fizesse outro auto-de-fé de ahi a um mez para os despejar e que elrei viesse assistir a elle. Além disso, João de Mello allude na carta aos autos-de-fé dos annos passados em que interviera, e elle só fora transferido para a Inquisição de Lisboa nos meiados de 1539. Em todo o caso a carta não pode ser posterior a 1543.