Página:Herculano, Alexandre, História da Origem e Estabelecimento da Inquisição em Portugal, Tomo III.pdf/205

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pena legal era a fogueira. Debalde se appelava do tribunal para o infante inquisidor-mór, ou deste para o conselho. O infante rejeitava a appelação, porque, a sua confiança naquelle homem era illimitada, e no conselho, a que João de Mello tambem pertencia, quem teria bastante audacia para reprovar o procedimento daquelle de quem tudo confiavam o infante e até o proprio rei[1]?

A estes factos, que ainda guardavam, ao menos pelas formulas, um symulachro de ordem, associavam-se outros francamente brutaes, mas que aos olhos do vulgo se cohonestavam como resultado do zelo religioso. Conforme vimos em outro logar, a torrente da emigração era continua e caudal, e dirigia-se em boa parte para os Paizes-baixos, o que bastaria para explicar o favor que em Carlos v achavam os loucos esforços do cunhado para destruir a classe mais rica e mais industriosa dos proprios estados. As cidades commerciaes de Flandres offereciam aos christãos-novos portugueses, não só um refugio contra a intolerancia, mas tambem um theatro adequado á sua industriosa actividade.

  1. Excessus Inquisitor. Civit. Ulissip. passim, l. cit., signanter, f. 300 e segg.