Página:Herculano, Alexandre, História da Origem e Estabelecimento da Inquisição em Portugal, Tomo III.pdf/357

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rece o temor de desagradarem ao vingativo monarcha por esses tristes elogios feitos ao homem que elle jurara perder. Assim como a dignidade altiva na desgraça é a manifestação mais elevada da grandeza moral do homem, assim o aviltamento perante o que o fez desgraçado é a mais asquerosa hyperbole da abjecção. Tal era, naquella conjunctura, o procedimento de D. Miguel da Silva. Não escondia os seus desejos de se aproximar do bispo do Porto, mas o bispo do Porto evitava o contacto do empestado politico. Ousado com o papa, increpando-o pela corrupção da igreja, o prelado portuense não queria practicar algum acto que significasse desapprovação das baixas vinganças de D. João iii, porque as consequencias do descontentamente do rei podiam ser mais serias do que as do descontentamento do pontifice. O fanatico não se esquecia de que era cortezão[1]. Entretanto, nas disputas entre o cardeal De Crescentiis e D. Fr. Balthasar, ou nos debates deste com Paulo iii, D. Miguel, se porventura se achava

  1. «porque me pareceo que D. Miguel da Silva e queria falar, me guardei de todolos lugares onde nos podíamos encontrar»: C. de D. Fr. B. Limpo a elrei de 22 de novembro, l. cit.