Página:Herculano, Alexandre, História da Origem e Estabelecimento da Inquisição em Portugal, Tomo III.pdf/57

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vam a situação de Balthasar de Faria duplicadamente difficil, visto que os ministros que o haviam precedido, revestidos do caracter de embaixadores, podiam empregar a força moal que d'ahi lhes resultava para vencerem certos obstaculos e ardis, contra os quaes sómente aproveitavam a decisão e a energia, ao passo que elle, investido de attribuições mais restrictas, estava longe de poder proceder com a altivez de que os seus antecessores, sobretudo D. Pedro de Mascarenhas, tinham sabido servir-se a proposito. Era essa uma das principaes vantagens que os conversos tinham tirado da quebra das relações diplomaticas entre as cortes de Lisboa e de Roma.

Entretanto, é certo que, apesar destas apparencias favoraveis para a causa dos judeus portugueses, e da protecção, sem duvida sincera, do cardeal da Silva, essa causa, que parecia ganhar terreno, ía em decadencia, decadencia cujos signaes vamos hoje encontrar nos documentos contemporaneos. Querer é, quasi sempre, poder: o que é excessivamente raro é o querer; e o erro vulgar consiste e ni confundir o desejar com o querer. O desejo mede os obstaculos: a vontade vence-os. D. João iii queria a Inquisição: os seus conselheiros queriam-na. Fosse cubiça, fosse fa-