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to ao nosso invento : que a nau sustenta-se nas aguas, porque estas são mais corporeas e crassas, e que a ave se libra ou vôa nos ares, porque esta é de corpo acommodado á raridade d'este elemento, que por leve não póde sustentar o grave : ao que se responde :

Têem as aguas os mesmos accidentes, que têem os ares : porque, assim como as aguas são mais grossas quanto mais distam da terra, assim os ares têem mais corpo quanto mais estão distantes do chão. Exemplo : o mar ou o rio sempre corre mais brando pelas extremidades das praias do que pelo profundo do vau; assim tambemo ar sempre sustenta mais as coisas na altura do que juncto á terra, v. g., deitamos de qualquer parte eminente uma prancha pelo ar, e vemos que esta juncto do chão é que arrebata mais o precipicio : a razão d'isto é pela maior ou menor distancia, que acha no curso por lhe faltar o vento que costuma tomar em maior altura. Têem mais outra propriedade, e é que, assim como as aguas mortas, agitadas de qualquer movimento se fazem mais vivas e vigorosas, assim tambem os ares, estando serenos, impellidos de qualquer instrumento se fazem mais tangiveis, que o vento não é outra coisa mais que um ar inquieto, agitado e impellido, que de brando passa por seu proprio movimento a ser furioso. Emfim, assim como as aguas nas innundações têem violencia para levarem pontes, e arrasarem vallas, e tragarem povoações, assim tambem teem impulso os mesmos ares nos terremotos para arruinarem cidades, e subverterem imperios.

Finalmente tem a agua com o ar tão conforme a qualidade, que ambos podem ter união mista sem repugnancia violenta, eomo tambem a agua a tem com a terra; que se assim não fôra não consentiriam os ares em si os vapores da agua, nem as humidades da terra, como qualidades repugnantes; que estas como contrarias se nâo podem unir conformes. O que se não acha no elemento do fogo, que com elle não pode subsistir outro qualquer elemento sem repugnancia violenta.