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O PAI
 

 


O pai vivia de hortelão; a filha vivia da costura; ambos vivião de uma esperança no futuro e de uma reparação do passado.

Tinha cincoenta annos o pai. Os cabellos brancos cahião-lhe em flocos da cabeça como uma cascata e davam realce ao rosto severo, energico, mas ao mesmo tempo cheio de uma dôr profunda e resignada. Os annos o tinham curvado um pouco; mas era esse o unico vestigio do tempo. Os cabellos brancos e algumas rugas da cara tinham-lhe apparecido em poucos dias, não gradual, por uma transformação rapida, como se alli passasse um vento maldito e destruidor.

Os olhos profundos, serenos, perscrutadores, pousavão em alguem como se forão os olhos da consciencia; e ninguem os soffria por muito tempo, tal era a magia d’elles.

Tinha a franqueza, sem ter a intimidade; não offerecia a casa a ninguem, nem ia á casa alheia em occasião alguma. Tinha fé nos homens, mas não a fé da credulidade cega; era uma fé que examinava, perscrutava, esmerilhava; não se fiava nas apparencias, não se deixava fascinar pelos primeiros aspectos; quando acreditava em um homem tinha-lhe analysado o coração.

E, ainda assim, ninguem poderia contar a gloria de lhe haver atravessado