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calavam-se muito bem calados, talvez por juramento dado...

Aquele vulto era o santão da salamanca do serro.

Blau Nunes sofrenou o cavalo.

Correu-lhe um arrepio no corpo, mas era tarde para recuar: um homem é para outro homem!...

E como era ele

quem chegava, ele é que tinha de louvar; saudou:

— Láus’Sus’Cris’!...[1]}

— Para sempre, amem! disse o outro, e logo ajuntou: O boi barroso vai trepando serro acima, vai trepando... Ele anda cumprindo o seu fadário..[2]}

Blau Nunes pasmou do adivinho; mas respostou:

— Vou no rastro!...

— Está enredado...

— Sou tapejara, sei tudo, palmo a palmo, até à boca preta do fumo do serro...

— Tu... tu, paisano, sabes a entrada da salamanca?...

— É lá?... Então, sei, sei! A salamanca do serro do Jarau!... Desde a minha avó charrua, que eu ouvi falar!... — O que contava a tua avó?

— A mãe da minha mãe dizia assim:

II

— Na terra dos espanhóis, do outro lado do mar, havia uma cidade chamada—Salamanca — onde viveram os mouros, os mouros que eram mestres nas artes de magia; e era numa furna escura que eles guardavam o condão mágico, por causa da luz branca do sol, que diz’que desmancha a força da bruxaría...

  1. Laus’ Sus’ Cris’! — Forma abreviada e estranha, é certo, porém expressiva da saudação — Louvado seja Jesus Cristo! Ouvimo-la inúmeras vezes, em nossa infância.
  2. Boi barroso — É a vaga relembrança de um boi encantado, que aparecia porém nunca era encontrado por mais procurado que fosse; e também denominação de uma antiga dança camponesa, cuja música era ornada de versos que eram cantados durante o folguedo.