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Era a teiniaguá, de cabeça

de cabeça de pedra luzente, por sem dúvida; dela já tinha ouvido ao padre superior a historia contada dum encontradiço que quase cegou de teimar em agarrá-la.

Entrecerrei os olhos, coando a vista, cautelando perigo; mas a teiniaguá veio me chegando, deixando no chão um duro rastro d’água que escorria e logo secava, do seu corpinho verde de lagartixa engraçada e buliçosa...

Lembrei-me — como quem olha dentro de cerração — lembrei-me do corria na voz da gente sobre o entanguimento que traspassa o nosso corpo na hora do encantamento: é como o azeite fino no couro ressequido...

Mas não perdi de todo a retentiva: pois que da água saía, é que na água viveria. Ali perto, entre os capins, vi uma guampa e foi o quanto agarrei dela e enchi-a na lagoa, ainda escaldando, e frenteei a teiniaguá que, da vereda que levava, entreparou-se, tremente, firmando nas patinhas da frente, a cabeça cristalina, como curiosa, faiscando...

De olhos apertados, piscando, para me não atordoar dum golpe de cegueira, assentei no chão a guampa e preparando o bote, num repente, entre susto e coragem, segurei a teiniaguá e meti-a para dentro dela!

Neste passo senti o coração como que martelar-me no peito e cabeça sonando como um sino de catedral...

Corri para o meu quarto, casa grande dos santos padres. Entrei pelo cemitério, por detrás da igreja, e desatinado, derrubei cruzes, pisoteei ramos, calquei sepulturas!...

Todo o povo sesteava; por isso ninguém viu.

Fechei a guampa dentro da canastra e fiquei estatelado, pensando.